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145: Produções Fictícias


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Em 1993, a comédia televisiva portuguesa estava em padrões mais populistas, longe do voyeurismo praticado pelos britânicos. Com o surgimento das televisões privadas, Herman José, cujos programas, apesar de populares, pareciam mais lentos, passava por problemas de argumentação, dado que já tinha exausto as suas capacidades em menos de dez anos.

A SIC nasce. Traz o formato internacional Spitting Image e cria o Jornalouco. Não era das PF, era da Mandala. E com um programa destes, que antes da sua versão da RTP parecia mais "amador", surge a ideia de criar um colectivo de humoristas da "nova praça". Eis que no renascimento da televisão portuguesa, Nuno Artur Silva começa a escrever textos de humor para os canais da RTP. Surge o Parabéns do Herman José, e com o passar do tempo, mais e mais escritores alinhados na sua veia de pensamento decidem criar a sua empresa. Nascia aquela que viria a ser a melhor produtora de guiões e programas de comédia em Portugal: as Produções Fictícias.

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Inicialmente, as Produções Fictícias não eram bem uma produtora, e sim uma agregadora de humoristas e guionistas e geeks que se juntaram para criar e consolidar todo um ecossistema de entretenimento nacional que atendia primeiro às necessidades do Herman, e mais tarde às do público em geral. Entre os primeiros contratados da nova empresa estavam a Maria Rueff, no Parabéns, e o Nuno Markl, que tinha uma vida bastante activa na rádio, trabalhando na extinta CMR e mais tarde na Comercial, depois de privatizada. Entre outros, estavam o Filipe Homem Fonseca e o João Quadros, que integraram a cúpula das PF durante muitos anos. Foi este último que conseguiu impulsionar a criação de "rádio criativa à PF", sem o alcance da produtora, com crónicas e rúbricas em nome próprio. A equipa directa das PF lançou o seu primeiro programa sem recorrer ao Herman, no caso com Ana Bola: Os Bonecos da Bola (o nome vem da Ana Bola e não do futebol) e um programa para a Comercial, As Canções do Herman. Em 1994, Markl começa a entrar directamente no grupo, escrevendo guiões para o Festival da Canção de 1994 e entrando na Comercial, onde está até hoje.

Aos poucos as Produções Fictícias começaram a ganhar mais impulso. O Parabéns começa a ganhar cisões em 1994, sendo o primeiro o Boião de Cultura, que também foi emitido separadamente. Com a entrada do Markl, começa também a escrever guiões para o Herman, que tinha mudado para a Comercial. Depois da primeira série para rádio do Herman na rádio privada, a Herman Zap começa como uma rúbrica na Comercial. Mais tarde, em 1995, na quarta e última temporada do Parabéns, a rúbrica dá o salto à televisão. Aqui surgiu a Melga Shop, que era uma paródia ao programa de televendas que a TVI emitia na altura (Amazing Discoveries ou Novidades Incríveis). Infelizmente, foi aqui que houve o polémico sketch da Última Ceia, que (segundo Nuno Markl) não tinha como intenção ofender as elites religiosas, e sim parodiar um estilo de jornalismo que estava a surgir em Portugal. Com isso, o Parabéns foi terminado e a RTP decidiu fazer um programa temporário para ver se o Herman continuava na RTP ou não, o Herman Total, que recorria a imagens de arquivo dos seus programas mais a partir do Hermanias. Na mesma altura, alguns nomes das PF foram convocados a começar a escrever a nova versão nacional do Spitting Image, o Contra Informação, que era produzido pela Mandala. De entre os programas da PF recorrendo a externos, este era o mais comprido em termos de emissão (14 anos, orçamento para figuras, inúmeras cisões nos primeiros 6 anos do formato). Herman teria uma nova rubrica, As Fitas do Herman, que seria a última na Comercial.

Spoiler

É a equipa que escreve os textos de Herman Enciclopédia e de outro programa humorístico da RTP, o Contra-Informação. Fundada por Nuno Artur Silva, alargou-se depois a Filipe Fonseca, João Quadros, José Pina, Maria João Cruz, Miguel Vital, Miguel Viterbo, Nuno Silva, Patrícia Castanheira e Rui Cardoso Martins. Além dos textos, definem os temas e criam as personagens, com uma grande liberdade criativa, embora auscultando Herman José. A inspiração destes novos autores (as idades rondam entre os 22 e 34 anos) está em humoristas norte-americanos como Jay Leno, Conan O'Brien ou Jim Carey e não nos "pobres" humoristas portugueses. Aqui, nesta participação "fictícia", reside talvez o segredo de um Herman eternamente jovem e sempre surpreendente.

"Se não estivéssemos a trabalhar para o Herman, teríamos dificuldade em fazer vingar o nosso humor. O público gosta mais de coisas previsíveis."

Nuno Artur Silva in VISÃO, 28 de Maio de 1997

"O guião-base é revisto de alto a baixo, em busca da uniformidade, mas não dispensa as conversas com o verdadeiro artista e com outros actores para esclarecer pormenores."

in VISÃO, 28 de Maio de 1997

"Nuno Artur Silva refere a 'completa liberdade de criação'."

Em Abril de 1997, estreia-se a primeira temporada (de duas) da Herman Enciclopédia, que se tornaria na opus principal do Herman na RTP, mais até do que O Tal Canal. O sucesso da série, juntamente com uma personagem que tinha criado recentemente para a rádio (Reverendo Remédios que passou a Diácono Remédios), fez com que a RTP mandasse lançar uma segunda temporada obtendo praticamente o mesmo sucesso. Sucede que a série era sempre fustigada pelos programas mais vistos na SIC à hora que passava. Ainda assim, foi suficiente para lançar novos bordões que geraram o mesmo efeito das novelas brasileiras: "Fantástico, Melga! Fantástico, Mike!" (a primeira dita por Mike e a segunda por Melga, Melga Shop); "Sexo puro e duro, como todos nós gostamos. Certo? Ceeeeeerto." (Rute Remédios, Sexo Para Todos na segunda temporada); "(Um artista é um bom artista.) Não havia necessidade." (Diácono Remédios, a primeira frase era opcional); "Onde é que estavas no 25 de Abril?" (Artista Bastos, paródia ao Baptista Bastos como apresentador do Monólogos Secretos, paródia às Conversas Secretas"; "Eu é que sou o presidente da junta" (dito por vários Hermans sobrepostos uns aos outros no sketch premiado (internamente) "Portugal Depois da Regionalização").

Os membros da equipa começam a produzir conteúdo fora das lides cómicas. Em 1998, estreia, depois de alguns atrasos, com textos de membros das Produções Fictícias, uma adaptação misturando imagem real e cenários chroma (a Herman Enciclopédia fazia bastante chroma na altura) da BD Major Alvega, produzida pela Miragem (mais tarde, a HOP! ficou com o espólio). Com o fim da Herman Enciclopédia, Herman regressa ao registo dos talk-shows (o Parabéns era uma mistura de talk-show e programa de variedades com gosto a concurso) com o programa Herman 98 (mais tarde Herman 99). As Produções Fictícias começam a escrever para a rádio do estado. À Antena 1 chegavam a Conversa da Treta (que mais tarde tinha adaptação televisiva na SIC) e a Herman Difusão Portuguesa (com emissão também na Antena 3). Por alturas da primavera de 1999 o Expresso falou sobre as Produções Fictícias, da qual irei transcrever em spoiler:

Spoiler

SÃO UM pouco como as personagens que dão voz às marionetas: fazem rir os outros mas nunca aparecem. O seu apurado sentido de humor faz as delícias das audiências televisivas quando transformam estrelas como Herman José, Maria Ruef, José Pedro Gomes e António Feio, nas suas marionetas. Os momentos altos de riso e gargalhada dos portugueses são produzidos por um grupo, de 12 pessoas, que trabalha num rés-do-chão esquerdo, com um pátio decorado com plantas e flores reais para os lados da rua Artilharia Um, em Lisboa.

Sob a direcção criativa de Nuno Artur Silva, onze pessoas, com idades entre os 28 e os 38, reunidas nas Produções Fictícias, escrevem os guiões para o «Contra Informação», o «Herman 99» e o «Conversa da Treta». Do passado fazem parte trabalhos feitos para o «Boião de Cultura» e o «Herman Enciclopédia». Tal como numa redacção de um jornal que não se tenha rendido ao tão em voga «open space», as equipas responsáveis por cada programa escrevem os textos no computador instalado em cada uma das divisões do apartamento. «Entregamos os textos a horas mas sempre no limite», explica Nuno Artur Silva. Horários não existem. Muitas peças são escritas pela noite dentro. O importante é o humor ir de braço dado com os acontecimentos. «Quando o António Vitorino se demitiu, durante um telejornal, falei para o Rui Cardoso Martins e o José Pina, que já estavam a fazer um novo texto para o 'Contra Informação' e tinham avisado a Mandala, onde são feitas as gravações, de que ia ser tudo alterado. Em menos de 24 horas, os bonecos do Contra estavam a falar sobre o assunto».

Os telejornais e os jornais são seguidos de fio a pavio pelos autores do Contra que também se inspiram no cinema para satirizar o mundo da política e do futebol. Como os jornalistas, têm também as suas próprias fontes que dão dicas, o que explica que estejam tão por dentro dos bastidores da política. A lei de imprensa não afecta as Produções. Além de cartas a criticar, para o bem e para o mal, não têm problemas com os originais dos bonecos. «É politicamente correcto os visados dizerem que acham graça ao 'Contra Informação'», reconhece Nuno Artur Silva lembrando que a apreciação mais azeda tem anos. O autor foi Pinto da Costa que, sentindo-se atingido num episódio, declarou que só admitia críticas do seu cão e do seu gato. Pouco dias depois, os protagonistas de mais um episódio do Contra eram precisamente o Bobi e o Tareco. «A Mandala tinha para lá dois bonecos que não sabia o que fazer deles. Calharam que nem ginjas», comenta, a rir um dos autores do «Contra Informação». Desde então, o presidente do clube portista não voltou a fazer comentários.

«Nunca nos metemos com a vida privada das pessoas. Somos mordazes sem ofender». Mas chamam um petisco a casos como o da Junta Autónoma das Estradas, da Moderna ou a uma embrulhada de um qualquer político.

Mas a independência - partidária, futebolística, faz parte da linha editorial do «Contra Informação». «Neste ano, especialmente, com eleições à porta, temos de ser justos e petulantes nas críticas mas disparamos para onde achamos que devemos disparar», frisa Nuno Artur Silva recordando que todos os programas produzidos nas Produções Fictícias já se meteram uns com os outros.

Terceiro aniversário
Das piadas de Herman José à Conversa da Treta de José Pedro Gomes e António Feio, as Produções Fictícias determinam o humor nacional

Com três anos acabados de fazer, o «Contra Informação» tem hoje cerca de 60 bonecos, feitos por um inglês, que leva por cada um cerca de mil contos. Para medir a graça de um texto, que na televisão tem a duração de cinco minutos, Rui Cardoso Martins e José Pina imitam as vozes do elenco do dia. Mas o verdadeiro artista que imita a maior parte das vozes na série é João Canto e Castro. Mário e João Soares, Santana Lopes, Carlos Carvalhas e Marcelo Rebelo de Sousa têm as suas vozes reproduzidas por Canto e Castro.

Estilo diferente tem o «Conversa da Treta», transmitido pela SIC, que tem como actores José Pedro Gomes e António Feio, que dão os últimos retoques no texto escrito por Filipe Homem Fonseca e Eduardo Madeira. «É o 'non-sense' de bairro. São duas personagens da classe D a ver o mundo à sua maneira. O calão é muito utilizado neste diálogo. Temos o espertalhão que até recorre a termos em inglês, que com o amigo elabora associações ridículas sobre tudo e mais alguma coisa», explicam os guionistas.

Mas o padrinho das Produções é Herman José, que continua a ser o grande pilar desta fábrica de fazer piadas. Um dos homens que mais apareceu na televisão portuguesa nas últimas duas décadas deixou de criar textos em 1992, depois de 12 anos a escrever humor. «É muito difícil escrever textos com humor, que é julgado pela gargalhada. Quanto mais conhecida é a piada pior é para o humorista, que jamais pode repeti-la», confessa. Mas «se os rapazes das Produções desaparecessem teria de voltar a escrever. Sou um sobrevivente». Todos os textos de abertura do «Herman 99» são produzidos no rés-do-chão das Produções. João Quadros, Miguel Vital, Miguel Góis, Ricardo Araújo Pereira e Nuno Markl são os cinco elementos que todas as semanas, além de fazerem a peça de abertura, preparam o texto de Maria Rueff (que se desloca à sede da empresa para escrever a peça em conjunto) e as perguntas aos convidados. O tema tem sempre a ver com a actualidade. «Limito-me a limar arestas. A minha intervenção não ultrapassa os 5%», afirma Herman.

A ligação da empresa do riso ao mais famoso humorista português estende-se também ao HermanDifusão Portuguesa, transmitido na Antena 1 e na Antena 3. «Mas é muito difícil fazer piadas todas as semanas», reconhece a equipa ao serviço do Herman. Até para o humor, o tamanho de Portugal revela-se prejudicial. «O universo de visados é muito pequeno», lamenta-se o grupo.

A violência da escrita
Herman José é o padrinho desta equipa de trabalho e a sua grande referência humorística

O director criativo, que hoje em dia já não escreve textos mas acompanha a edição das várias equipas e participa activamente no arranque de cada programa, corrobora a tese de que escrever textos humorísticos é uma violência.

No princípio dos anos 90, Herman José, que na época tinha o programa «Parabéns», foi ter com Nuno Artur Silva depois de ter visto um argumento feito para o José Pedro Gomes e o António Feio. «Passados uns meses já me estava a propor uma série de coisas e então tive de ir buscar um grupo de pessoas para escrever comigo», recorda Nuno Artur Silva. É com a continuidade do trabalho pedido pelo Herman para a televisão e a rádio que se profissionaliza a equipa das Produções Fictícias.

Nos próximos meses os fãs do Herman poderão ter acesso ao «site» «hermanet», que mais uma vez é um trabalho das Produções. As vários personagens a que Herman foi dando corpo, como o Estebes e o Diácono Remédios vão estar acessíveis na net.

Mas as Produções preparam-se para outros voos. Na calha está um «sitcom» «Não és homem não és nada», que tem como protagonista Alexandra Lencastre. São 13 episódios passados na redacção de uma revista feminina em que os jornalistas são homens. «Eles vão ter de saber responder a questões do tipo como reagir nos dias difíceis e as 50 maneiras para não perder o seu namorado», avança o criativo da empresa.

A médio prazo, os planos não passam definitivamente pela sátira. «Somos conhecidos como um grupo de humoristas e o nosso objectivo agora é fazer ficção. Queremos escrever para teatro e cinema e não ficarmos limitados ao mercado do humor», acrescenta. «Ter que ter graça é muito violento, especialmente com tão poucas figuras públicas».

Para continuarem por detrás das cortinas, as Produções Fictícias mandaram para o palco, para receber em seu nome o Globo de Ouro da Caras/SIC, uma escandinava que nada tinha a ver com o assunto, porque ficava melhor no boneco.

MONICA CONTRERAS

Contra-Informação

SEDE do Conselho de Ministros. Estão todos com um copo de vinho na mão. Vemos pratos e comida na mesa. Estão presentes Toneca Guterres, Jorge Coelhone, Aspirina Moura, Zorro Rodrigues, Maria de Ninguém, Manuel Maria Sarilho, Seja Franco e Bera Jardim.
Toneca: Bom, creio que sabemos todos ao que brindar nesta jantarada.
Aspirina Moura: Ao desenvolvimento do país?
Seja Franco: À Agenda 2000.
Zorro Rodrigues: Ao novo abaixamento da taxa de emprego?
Toneca: Não, ao trambolhão que o PSD deu quando já estávamos a ficar preocupados...
Coelhone: Eu a isso também bebo! Hoje é dia de festa!
De repente caem umas cuecas de mulher em cima da cara de Sarilho.
Sarilho: Mas que disparate é este?
Vemos a «stripper» a dançar, com música.
Coelhone (pânico): A 'stripper' voltou a atacar. Chamem a polícia.
Entram os fotógrafos e começa uma chuva de «flashes».
Toneca: Oh, meu Deus nosso senhor! Fujam, fujam, é o Apocalipse, é o Armagedão!
Todos (menos Bera Jardim, fugindo esbaforidos): Ahhhhh... sai da frente! A porta, ahhhh!
Vemos que Bera Jardim ficou para trás com um ar calmo, enquanto ela dança à volta dele. Surge Toneca, meio tapando os olhos com a mão para não ver a mulher.
Toneca (ríspido): Oh, Bera Jardim, sai daí imediatamente, pareces um desses tarados da PJ. Olha que isto já não tem piada nenhuma.
Bera Jardim: Não te preocupes, Toneca. (Vira-se para a «stripper», muito calmo). Oh, rapariga, pára lá com esse disparate, veste-te e vai para casa. (Ela pega nas roupas e sai). Fui eu que arranjei este plano para meter uma 'stripper' nas mais diversas reuniões e jantares por esse país.
Toneca: Para quê, meu Deus?
Bera Jardim: Olha, para grandes males, grandes remédios. Quero transformar esta bronca do jantar da PJ em Aveiro num caso normal que já não choca ninguém. Sinceramente, não me apetece ter que demitir mais nenhum director-geral. Por este andar não sobrava nenhum.

Conversa da Treta

(A propósito do Kosovo)
Tóni: E a NATO? Hã? Qual é a posição dos gajos no meio disto tudo?
Zezé: Tóni, pá, Tóni... A NATO vive disto, pá, já lá está à trolitada! Nós é que somos uns meninos, andamos aqui a ver passar porta-aviões! Eu, por minha vontade, metia-me já dentro dum tanque e ia largado. Aliás, já lá estava, a amandar bombas e «cocktails Molotov»! Aliás... tu é que já lá estavas...!
Tóni: Eu? Sozinho? Eh, pá, eu pensava que estavas comigo nisto, Zezé...
Zezé: E estou, pá, tem calma contigo, não te empiúrses! Nesta coisa há que ter estratégica! O plano é o seguinte: tu vais à frente com o estandarte e com as lanças...
Tóni (entusiasmado):E com o tambor! Eh pá, Zezé, deixa-me ir com o tambor, pá! (Imitando um tambor) Trrum-Tum-Tum-Tum... Eh, pá, muito gosto eu de um bom tambor!
Zezé: Oh, homem, leva o tambor, caraças! O importante, no meio disto tudo, é que tu vás à frente! Sempre assusta, não é?
Tóni: Guerra psicológica, né? Boa, boa!
(A propósito dos médicos)
Tóni: Olha que isto de ser médico é porreiro, pá. Salvar a vida às pessoas...
Zezé: Mas tu salvaste a vida a alguém?
Tóni: Eh pá, não toquei em ninguém, devo ter salvo uma data delas! Foi o primeiro caso de negligência médica em que se salvaram vidas. E julgas que alguém me agradeceu? Nada! Ninguém dá o devido valor aos médicos!
Zezé: Pois é, pá! Isto o mundo está cheio de injustiças...
Tóni: Depois admiram-se que os médicos façam greve!
Zezé: Também fizeste?
Tóni: Claro, pá! Era os corredores ali, cheios de doentes, a dizer 'sôtor! sôtor!'. E eu: 'Pssht! Tou de greve! Tás doente? Azar! Tou de greve! E pouca confiança! Respeitinho, que eu andei cinco anos a estudar e não foi para aquecer!'
Zezé: Cinco anos? Ah, então sempre acabaste o primeiro ano do ciclo.
Tóni: Falta-me só aritmética. Bom, mas como eu estava a dizer: avanço por ali, por cima das macas - 'Desculpe... Com licença...' -, vou direitinho ao refeitório, pego no tabuleiro, e... pás! Amandei o tabuleiro para o chão! 'Eu não como esta treta! Tou em greve de «self-service»!'

O Herman sai da RTP no fim do ano deixando dois projectos: assinando a meias entre a sua produtora (Herman Zap Produções) e as Produções Fictícias a série Não és Homem, Não és Nada, e o programa de passagem de ano A Última Noite, que foi ao ar antes da passagem de ano de 1999 para 2000 (tendo o programa terminado por volta das 23:30, antes da emissão em directo da passagem de ano acho que no Algarve). Foi ainda em 1999 que a Conversa da Treta é emitida na SIC, sendo o primeiro programa produzido pelas Produções Fictícias a ir ao ar num canal privado. Também, olhando ao potencial das novas tecnologias, Herman José cria rábulas para a internet (Herman Net) no SAPO.

Em 2000, Herman José entra pela primeira vez na SIC com o monumental programa de domingo à noite Herman SIC, que obteve um sucesso astronómico e alguns programas especiais (antes da SIC sobreutilizar a palavra "especial" umas 800 vezes por semana). A equipa começa a dirigir às crónicas nos jornais, começando pela crónica Felizes Para Sempre no Expresso. Em 2001 surge no jornal A Bola As Crónicas do Zé Manel com a personagem do Zé Manel Taxista, rampa de lançamento para a série O Programa da Maria, cuja figura central era Zé Manel Taxista (Maria Rueff), a ser espiado pela concorrência entre a TIC e a VTI. O formato da SIC não teve tanto sucesso, junto com Paraíso Filmes (que tinha duas temporadas). Ambas as séries foram atiradas para horários da madrugada sendo que O Programa da Maria iria passar inteiro nos canais de cabo da SIC. O que aconteceu com estas séries enfureceu Nuno Markl, da mesma forma que fizeram o mesmo com Seinfeld na TVI. Em 2002, surge uma nova série para A Bola, As Crónicas da Dona Bitória. Pelos vistos, já se cansaram da personagem benfiquista do Zé Manel e decidiram criar uma personagem portista.

Em 2003, as Produções Fictícias fizeram dez anos, estreando o seu primeiro produto para cabo, Gato Fedorento (que foi ao ar na SIC Radical por três temporadas). O primeiro programa na TVI (e até à data o único do registo cómico), a adaptação televisiva do êxito O Homem que Mordeu o Cão (produzido pela Visual Links. Alguém sabe se esta produtora operou com outro nome ou só fez este programa?) que tinha sido mudado para a Best Rock. Esta versão televisiva não é demasiado lembrada, ou porque passava bem tarde ou porque há poucos registos na internet. (alguém que procure o sketch da caça aos O-Zone que era da segunda temporada, e que ouvi falar pelos idos de 2014) E na imprensa, começa a ser publicado O Inimigo Público, que vinha às sextas no Público. O suplemento que era publicado às sextas era influenciado pela "ordem Onion" (se bem que já tinha um influenciador em Portugal, o site inÉPCIA).

Por incrível que pareça, os membros das Produções Fictícias escreveram guiões para o Inspector Max, aquela série que sempre será recordada como "aquela série que enche as grelhas do fim-de-semana de manhã da TVI há muitos anos". Já desde 2002 tinham atingido o bichinho do teatro, e ainda em 2004 lançam O Eixo do Mal na SIC Notícias, que continua no ar até hoje.

Em 2005, as Produções Fictícias lançam para duas versões fracassadas de formatos de fora da televisão para a SIC: Manobras de Diversão (que nasceu como espectáculo de teatro) e IP TV, adaptado do Inimigo Público (que alguns anos mais tarde teria versão com mais sucesso no Canal Q). Lançam o projecto Voz (que costumava passar depois do Telejornal) como um projecto de poesia (acho que acabou como livro), criam crónicas para os 3 grandes para A Bola e o Kulto para o Público.

Em 2006 os Gato saem da SIC e entram na RTP (e por consequência na TV terrestre nacional) com a quarta temporada da série clássica. Sucesso igual às temporadas da SIC Radical, em Outubro passou a um novo formato (Diz Que é uma Espécie de Magazine) com duas temporadas (a primeira dividida em duas segundo o DVD). No mesmo ano é criado o Portugalex (que para mim entretanto perdeu a piada) que ainda está no ar hoje. Entretanto acaba-se o Herman SIC e é criada a Hora H, ambientada no fictício Canal Nacional de Notícias (CNN). Com a saída dos Gato da RTP, depois de um programa em jeito anos 80 (a suposta passagem de ano de 1984 para 1985 com a participação de Sabrina Salerno), regressam à SIC mas à generalista com uma temporada do Zé Carlos (último programa seguindo a fórmula clássica dos sketches) e em 2009, Gato Fedorento Esmiúça os Sufrágios (devido às duas eleições do outono de 2009) em registo de Daily Show eleitoral. Em 2007, a PF TV é lançada no recém-criado SAPO Vídeos.

Em 2010, Herman regressa à RTP (depois de uma breve passagem na TVI) com o Herman 2010/2011/2012/2013 e foi também convidado a aparecer obrigatoriamente nos programas de passagem de ano que eram meras reuniões das Produções Fictícias. Com o passar do tempo, a qualidade começou a cair.

Em 2011, depois de três temporadas de Os Contemporâneos e de uma tentativa falhada de fazer algo idêntico com O Que Se Passou Foi Isto pelos idos de 2009, estreia-se a série Estado de Graça, que apesar dos seus pontos altos tinha os seus pontos baixos de forçadice e falta de graça, e em 2013, depois do fim da série, chega o regresso às séries de sketches sem recorrer a temas da actualidade, Breviário Biltre. Aquilo era tão lixo mas tão lixo que nem a qualidade dos sketches era digna de um programa de jeito. Isso e a quantidade de asneiras censuradas (tudo bem, mas é horário nobre, e há "crianças a ver". Porém, há "crianças a ver" alarvidades que não são apropriadas para a sua idade, como, sei lá, O Triângulo?). A mesma equipa de actores (com o Manuel Marques do Portugalex) foi também para mais uma série, A Mãe do Senhor Ministro, adaptado de uma série dos anos 90 e com níveis altíssimos de rasquice. Igualmente tínhamos Donos Disto Tudo por alguns anos, mas aquilo já era de tão baixo nível que nem parecia algo que tinha visto no auge das PF

Foi por esta altura que comecei a ter uma percepção algo negativa das Produções Fictícias, que as suas obras já não eram como eram no passado, e que a qualidade quer dos programas quer do canal que gerem (o Canal Q) tem baixado incessantemente.

A isto, soma-se a ida de Nuno Artur Silva à RTP (juntamente com Gonçalo Morais Leitão para trazer algumas ideias fora da caixa que não resultaram para promos e tal). Entretanto NAS (que fundou as PF e o Canal Q) saiu da RTP para ter um cargo no governo até 2022. Outras figuras como a Susana Romana (outrora crítica de filmes pornográficos) passaram a tentar encher o vácuo deixado por NAS, mas sem grande sucesso.

Tirando o Gargalhadas à Grande, as Produções Fictícias praticamente já não produzem séries de comédia, provavelmente como fruto da constante divisão da sociedade actual, sendo que os novos conteúdos que eles fazem são para o Canal Q, ou são talk-shows sérios ou são programas de culinária sem piada (literalmente, o mais recente formato do canal é um programa de culinária que caberia num 24Kitchen ou numa SIC Mulher) ou programas culturais (sobretudo de índole musical, para apoiar artistas que só tem como 40 seguidores e que não passam muito nas rádios nacionais). Muito se pode dizer do estado actual do humor em Portugal e de mudar para o YouTube (apesar de estar numa fase mais conservadora). Qual será o rumo que vão tomar as Produções Fictícias?

Esta crónica foi meio incompleta. Se quiserem adicionar mais informação (estrutura da empresa, séries em falta, livros como os do NAS), por favor, escreva e eu actualizo.

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