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R15: Flama, 12 a 17 de Maio de 1967


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(primeira parte)

Hoje As Revistas da Gente vão para uma década que até agora não foi coberta - e provavelmente será a revista mais antiga do nosso espólio - a semana em torno do dia 13 de Maio de 1967, aquando da visita do Papa Paulo VI a Portugal, nos 50 anos das aparições de Fátima. 50 anos depois viria o Francisco no centenário, o resto é história.

A nossa viagem incide no antigo regime do Estado Novo - Portugal era (sem as colónias) um país rico com muita pobreza - tipo o Brasil na mesma altura e a África do Sul mas sem apartheid. Não falaremos sobre uma revista de televisão - hoje trazemos a primeira revista "generalista" - uma Flama, parte de um rico espólio de publicações relativas àquele 13 de Maio que favoreceu o Telenoche do Canal 13 argentino - foi esta a sua primeira cobertura internacional, quase sete anos antes da Globo! Ora, para ter uma ideia do quão diferente era o Portugal salazarista, a televisão era um objecto de luxo - pouca gente tinha, nas aldeias havia uma ou duas. Um luxo para uma emissão que só começava por volta das 19 horas. Ainda não havia televisão na África do Sul - o próprio governo achava que era a caixa do diabo uns anos antes.

A Flama já tinha sido publicada desde 1937 e foi publicada pela Juventude Escolar Católica - duas organizações com o mesmo nome surgiram no mesmo ano (1935) em Portugal e no Brasil. A brasileira tinha menos sorte devido ao golpe de 1964 e nos anos seguintes teve tentativas de continuar, sendo que depois acabou definitivamente. A portuguesa sobreviveu ao 25 de Abril e foi desmantelada em 1980 devido a uma fusão com uma outra entidade, criando o Movimento Católico de Estudantes. Em 1966 entrou em dissabores com a Mocidade Portuguesa.

A Flama era uma revista que era tipo uma mistura de Visão com Nova Gente (se bem que antes de haver a Nova Gente em 1976 havia uma Gente que durou pouco), uma revista que tentava misturar celebridades com informação, tudo visado (até 1974) pela Comissão de Censura. Ainda me lembro de um caso ridículo uns anos antes do 25 de Abril de um jornal (segundo o Jornal da Noite de 25 de Abril de 2015) que era impedido de publicar uma notícia sobre testes de emissões a cores entre Espanha e França, porque será? Porque Salazar e o interino depois da sua morte achavam que a televisão a cores era caríssima ou ajudava aumentar as desigualdades sociais? Ninguém sabe.

A revista acabou em 1976 - durante o PREC, muitas empresas e publicações que marcaram a bonança económica do antigo regime faliram. Há muitos saudosistas que dizem que, apesar da liberdade de expressão que temos hoje, sentem saudades do passado (económico) que havia.

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Eu já aqui falei sobre o evento que pautou a data em questão - a visita do Papa, portanto a capa é toda dele. 50 anos depois, referências à visita do Papa - que apesar da cobertura altamente mediática por parte das televisões generalistas - teve menos ocupação de capa. Dificilmente iríamos ver capas da TV 7 Dias a dizer CHEGOU O PAPA, pois parecia uma estranha mistura entre a dita e a revista italiana O Meu Papa - que chegou a ser publicada há alguns anos aqui em Portugal numa versão traduzida.

Esta crónica terá duas partes. Na segunda, um desfile de fotos cheias de pessoas vestidas na moda conservadora dos anos 60 e muito mais.

Agradecimentos à Hemeroteca Digital de Lisboa por facultar esta edição. O mesmo site tem também mais duas edições deste ano (a anterior a esta - a milésima - e a posterior) e um par de edições de 1951 e 1974. Link: http://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/Periodicos/Flama/Flama.htm

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(segunda parte)

A revista de hoje fala sobre temas que certamente uma revista de 2021 não suportariam falar. Teria sido a orientação católica?

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Começamos com um anúncio da extinta Ciesa, nome representativo das publicidades televisivas e impressas dos anos 60, à Terylene - que até se alastrou à era croma. O anúncio é ilustrado por um par de mulheres portuguesas do padrão anos 60 - longe da azáfama dos dias de hoje.

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Dificilmente um editorial teria tais trejeitos. A Flama faz 23 anos - teria havido uma primeira Flama, sendo esta nascida em 1944? Ninguém sabe, ninguém quer saber. E ainda exalta os valores da "Fé e da Pátria" (com letras maiúsculas) - tal era o patriotismo que havia há 54 anos num país mergulhado por nacionalismo a rodes. O antigo regime era assim: Deus, Pátria, Família. E ainda assim, apesar destes apelos, revistas eram coisa da classe mais alta - dá para ver porque é que as revistas tiveram um declínio na sua qualidade - tem a ver com a queda do quociente de inteligência de muitos portugueses?

Já agora querem que o conjunto (hoje diz-se banda) Os Infernais actue na RTP. Ah, e um passatempo para ganhar um novo aspirador da Electrolux.

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A Flama traz em exclusivo as cartas de Vladimir Komarov, que faleceu a 24 de Abril. Cartas dos anos 40.

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Quem são os Deltons? Porque é que recorrem a exercícios matemáticos da primária? De que alimentam (acabei de inventar esta, infelizmente)?

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Mina em riscos de ficar cega. Carl Dean Wilson compareceu a um interrogatório do FBI. Petula Clark canta para o presidente Lyndon B. Johnson.

Flama-N1001-12-Mai1967-08.pngFlama-N1001-12-Mai1967-09.pngFlama-N1001-12-Mai1967-10.png

Dificilmente veríamos isto numa Visão com este tom. Veríamos mais era na net, acompanhado por textos tipo clickbait e com emoção forçada (porque é que tudo hoje tem que ser forçado?). A UNESCO conseguiu recuperar valioso espólio egípcio, e ainda bem.

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Quando o BES era o BESCL, este era um guia de viagens prosaico que dava dicas prosaicas sobre viagens para fora.

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Os altos e baixo do Barreirense, numa altura em que voltava à primeira liga. Hoje baixou - e muito! - para as distritais de Setúbal.

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Com um título destes mais parece um panfleto promocional da própria CUF.

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Uma análise estatística aos universitários da época e o que fazem.

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Entrevista a Roger Moore, uma das celebridades estrangeiras mais prestigiadas pelos portugueses do antigo regime, a falar sobre o seu sucesso: O Santo.

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Por um lado: "uma sensação de frescura no seu dia-a-dia", muitos diriam o mesmo. Primavera, "uma água de colónia agradável de tipo francês". Credo, que tecnicidade. Por outro, a vida é mais bela e mais confortável com Singer.

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Menos de um ano depois do auge no Mundial, Eusébio atinge o seu ponto mais baixo com o pior chuto da sua carreira.

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Queima das Fitas de 1967. Eu disse que a revista era de jovens universitários, daí tinham de fazer uma peça sobre isso.

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Já há moradores nos novos prédios de Santo António dos Cavaleiros!

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A semana na RTP: na altura em canal único com uma grelha regular a partir das 19:00/19:30 (ainda não se sabe se a TV Educativa constava da grelha regular da RTP). Grelha bem equilibrada para a altura e para as limitações do serviço e do regime, com uma dúzia de programas temáticos sobre coisas tão prosaicas como artes plásticas e desporto, muitos enlatados da ITC - principal doadora de conteúdos estrangeiros - e ainda o enigma da tal "Agenda da Praça" na primeira edição do Telejornal - o que seria?

E claro, sendo esta a vinda do Papa, a RTP não podia faltar à cobertura de Fátima - especial este ano por razões que já sabemos e já vamos aprofundar.

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Fátima receberá a "consagração máxima": o cinquentenário das aparições com a vinda do Papa.

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Como não podia deixar de ser, a Flama, ainda imbuída pelo catolicismo da publicadora, traz um exclusivo com imagens do Vaticano.

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Amália Rodrigues esteve em Paris, a encerrar as supostas olimpíadas da canção.

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Realeza: Pilar de Bourbón disse sí à noiva, mas o povo por fora aguentou a chuva.

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Mais realeza. Agora apercebi-me que troquei algumas páginas, triste sina

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Página de anúncios - metade dela ocupada pelos Nitratos de Portugal.

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O que restava do casamento e mais um carro francês - desta vez o Renault 4.

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Anúncio ao pronto-a-vestir Pinheiros, na época refém dos slogans que tinham que rimar com o nome da empresa, segundo a Caderneta de Cromos "sob pena dos criativos irem à cadeia" (ver também Veneza: o prazer à sua mesa).

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Estude por correspondência no curso de rádio e TV da Philips e seja um grande técnico!

Compre os legítimos caramelos Vaquinha, porque um cão é um cão e uma vaca é uma vaca. Vaquinha é tudo o que os outros não são.

Ana de Sá revela os seus dotes na sua interpretação de Frei Luís de Sousa.

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Anúncio às motas Vespa, mais uma refém das rimas, mas não com o próprio nome, aqui já seria mais complicado.

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Concórdia ou Concorde? Fica no ar a questão.

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E como é que será este avião? Quando é que aceitará ter passageiros a sério?

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Sugestões culturais, do tempo em que as touradas eram "aceites". Hoje seria todo o contrário.

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Ofereça Pérolas Majorica como prenda de Páscoa. E porque não? A Páscoa já foi e hoje já deviam adiantar as duas Páscoas adiadas. Falo por experiência própria e por estar farto da saturação. Ah, e os discos. Discos que só a classe alta pode obter.

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Anúncio à camisa Million Look.

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Desenha um carro, dir-te-ei como guias.

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Um anúncio da (precocemente extinta) companhia aérea belga Sabena.

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Página da mulher.

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Moda e culinária: esta semana: dois pudins!

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Análise ao bacalhoeiro Gazela I.

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Palavras cruzadas da Flama, Totobola (já chegou a ser grandiosa) e caricaturas.

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Um outro anúncio da Terylene, do mesmo estilo.

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E na contra-capa a cores, um anúncio da Planta. Menos de uma década depois de surgir passou de ser "a gordura das pessoas de bom gosto" para ser só "para as pessoas de bom gosto".

E pronto, está terminada a viagem a 1967. 54 anos depois, tudo mudou. Uma revista de altíssima circulação não teria textos de cariz arqueológico, porque mesmo se vão à net acaba por ser tudo tendencioso, nem notícias sobre visitas do Papa a Portugal, porque nem uma capa aguentaria para por uma foto, a sobrecarga tomou conta da imprensa e o mundo perdeu as estribeiras e deixou de fazer sentido.

Se hoje em dia tudo é tendencioso, naquela altura algumas coisas eram - visto haver a censura e proibirem coisas tipo beijos ao ar livre e na televisão - e claro havia falta de acesso a informação para todos - nem todos tinham um rádio nem mesmo nas aldeias. As revistas eram coisa de rico assim como grande parte da suposta indústria cultural portuguesa.

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